domingo, 22 de abril de 2007

Tenho uma reunião marcada… com o meu Filho!

Será que estamos a dedicar tempo suficiente às nossas Crianças? Se as Crianças são inequivocamente o nosso Futuro, não estaremos nós a hipotecar esse Futuro? A corrida entre o aqui e o agora não serão fugas permanentes?

Antes de mais, onde estão todos aqueles longos e fundamentais compassos de espera?
• A espera, a longa espera ANTES da gravidez, estar grávido DA gravidez, a gestação da ideia de um novo ser?
• E a espera serena DURANTE os meses da gravidez, o enamoramento progressivo por um ser que já É e vai nascer?
• E o Parto? Onde está o Tempo para o viver integralmente, para a comunhão tão doce com a nova Criança?
• E depois do nascimento, onde estão todos aqueles momentos de cumplicidade, de colo incondicional, de contemplação mútua, de longos silêncios em que a palavra se dispensa e se conversa apenas com gestos largos?
• (Para onde foi esse silêncio?)
• E onde estão os passeios, os longos passeios a pé, de mão dada? E as histórias lidas, relidas, vezes sem conta? E as brincadeiras de gatas, no chão, sem pressa?
• E os brinquedos que não se brincam sozinhos? Para onde foram eles?

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Há um poema muito belo de Denise Roux que diz como os meninos que sofrem de fome são bem-educados: não falam com a boca cheia, não brincam com a comida, não fazem birra para comer, sofrem em silêncio, amarguradamente, pedem, suplicam, mas apenas com o olhar.

Mas há outra fome, e dessa fome pouco se fala e dela sofrem muitos dos nossos meninos, por todo o lado, meninos que muitas vezes moram mesmo ao nosso lado (e nós não vemos...). E dessa fome sofrem milhares dos nossos meninos, ricos ou pobres, pequeninos ou grandes, brancos ou negros.

É a fome de tempo, que dói, dói tanto... E vai roendo, rói por dentro, devagarinho, e faz os meninos sentirem-se pequeninos, sem valor, sem importância. E essa fome é mal-educada, sabem? Os meninos que sofrem por falta de tempo para eles, por falta de atenção, por falta de amor, são mal-educados. Fazem tudo para chamar a tenção, dizem palavrões, são violentos, fogem-nos das mãos, incomodam.

Mas se nos pusermos de cócoras diante deles (para conseguirmos atingir a sua altura imensa), se lhes falamos baixinho, se lhes estendemos mansamente as mãos, eles rendem-se imediatamente e aninham-se tremendo no nosso colo.

Eles precisam de saber que existem. Eles precisam urgentemente de acreditar que podem ser amados e que alguém os pode olhar nos olhos, demoradamente, com ternura... Eles precisam de nós. De todos nós. Urgentemente.

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E agora gostava de vos contar três histórias que ilustram bem tudo o que disse anteriormente:


• Quando o meu filho era pequenino, tinha 3 ou 4 anos, em conversa com uma outra Mãe, contei-lhe que passava muito tempo com o meu filho, diariamente, conversando e brincando com ele. A outra Mãe, olhando-me, condoída, perguntou-me:
- Coitadinho, que doença tem o seu menino?


• Um Filho chama o Pai. O Pai diz que não pode, que não tem tempo, que tem que ir para o trabalho. O Filho chama novamente pelo Pai. O Pai zanga-se, diz-lhe que tem que ganhar dinheiro para manter a casa, que tem um cargo de muita responsabilidade, que não pode mesmo. O Filho chama novamente pelo Pai, diz que é só uma pergunta. O Pai, impaciente, diz-lhe então que se despache. Então o menino pergunta.
- Quanto ganhas por hora, Pai?
O Pai, nervoso, responde que recebe 100 euros, mas que não percebe onde o Filho quer chegar, e que precisa de sair imediatamente.
Então o Filho pede-lhe:
- Se eu te der a minha mesada, os meus 50 euros de mesada, podes passar meia horinha comigo?

• A última história (e porque todos gostamos de ouvir histórias, não é?, apesar destas serem tristes) passa-se num Orfanato da Alemanha durante a 2ª Guerra Mundial. Muitos bebés que lá estavam internados, apesar de todos os cuidados de saúde e de higiene (eram alimentados e mudados regularmente) morriam sem que ninguém percebesse porquê. No entanto, o bebé que ficava junto à porta, sobrevivia estranhamente. Até que se descobriu que havia um porteiro à saída da sala que habitualmente olhava para o bebé que estava mais perto, sorria para ele, conversava com ele, enfim, dava-lhe atenção, dava-lhe Tempo. Esse bebé sobrevivia porque tinha Tempo. Os outros faleciam porque havia falta de Tempo para eles…


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É FUNDAMENTAL que tenhamos Tempo para as nossas Crianças, que estejamos com elas, que estejamos FÍSICA e EMOCIONALMENTE com elas (porque não estamos PRESENTES se estivermos apenas “EM CORPO PRESENTE”, olhando para o relógio, saltando sempre que toca o telemóvel, acenando com a cabeça para fingir que acompanhamos o que Criança nos diz…).

É FUNDAMENTAL que tenhamos Tempo para elas, e assim também Tempo para nós próprios também, para reaprendermos a escutar, a contemplar, a estar mais disponíveis para a beleza que nos rodeia…

É FUNDAMENTAL que tenhamos o direito (mas também a vontade…) de interromper os nossos compromissos pessoais e profissionais, sem receio, para podermos estar mais Tempo com as nossas Crianças.

É FUNDAMENTAL que digamos sem medo, com entusiasmo, com alegria:

-“Agora não posso. Tenho uma reunião marcada… com o meu Filho!”



Maria do Céu Guitart
III Conferência Meninos de Oiro
“Mais Tempo para o Futuro”
CCB
2006

4 comentários:

Mimá disse...

bem, este texto está lindissimo e diz umas verdades bem dolorosas :-(

parabens, muitos beijinhos e felicidades :-* XXXXXXXX

RUTE MATOS disse...

OLá
O TEXTO ESTÁ REALMENTE REAL. LINDISSIMO
MOSTRA O Q SE PASSA NA REALIDADE
SOU AUXILIAR DE EDUCAÇÃO E PASSO MAIS TEMPO C OS MENINOS DO COLÉGIO Q O MEU PRÓPRIO FILHO E REALMENTE ISSO DÓI, PQ ME FALTA "TEMPO" PARA ELE.
VCS COSTUMAM FAZER MTS CONFERÊNCIAS??? GOSTARIA DE PARTICIPAR NUMA
BJKS PARA OS MENINOS DE OIRO

marjan hols reis photography disse...

parabens com blog. Queria muito saber que eu pode fazer para ajudar com minhas fotos beijinhos

MENINOS DE OIRO disse...

Olá Rute
Obrigada pelo seu simpático comentário. Mas o tempo, embora falte muitas vezes para os nossos filhos e isso seja muito triste, também pode ser para eles um tempo de qualidade. Oiça uma história muito bonita:

"Numa reunião de pais, numa escola da periferia, a directora incentivava o apoio que os pais deveriam dar aos filhos. Ela insistia que eles deveriam dar um jeito e, mesmo todos trabalhando fora, deviam encontrar uma forma de se fazer presentes.

Ela ficou muito surpreendida quando um pai se levantou e contou, no seu modo humilde, que ele não tinha tempo de ver o filho durante a semana, pois quando saía para trabalhar, muito cedo, a criança estava a dormir. Quando voltava, já era tarde e o filho tinha ido para a cama. Se ele não fizesse isso não teria como sustentar a família.

Ele tentava redimir-se indo beijar os filhos todas as noites quando chegava em casa. E, para que o filho tivesse a certeza da sua presença, dava um nó na ponta do lençol. Isso acontecia religiosamente todas as noites! Quando o menino acordava, sabia, através do nó, que o pai havia estado ali para beijá-lo.
O nó era o elo de comunicação entre eles.
Mais surpreendida ficou a directora quando constatou que o filho desse pai era um dos melhores alunos da sala!

Essa história faz-nos reflectir sobre como são muitas as maneiras de um pai, mesmo sem tempo, estar presente.

Você já deu um nó no "lençol" Hoje?"

O "nó no lençol" (embora metafórico, claro) é importante, mas na minha opinião não será suficiente. Mas não deixa de ser um modo bonito de estar presente!

Um beijo para si, e, se puder, visite-nos. Teríamos muito gosto!